sábado, 20 de junho de 2009

Da tecnologia à arte


“Quanto mais tecnologia eu vejo, mais acredito no talento”.

A afirmação foi feita por Nelson Motta, ontem, em palestra para o Porto Musical sobre “o futuro da indústria fonográfica com o advento das novas tecnologias e meios de comunicação”.

Apesar de dirigida à música, a frase que soa como advertência vale para toda forma de arte, e mais ainda para aquela produzida pelo artista tecnológico, pois traz implícito o questionamento do “valor da obra” em relação ao aparato tecnológico de que se serve – quando não é, a própria obra, pura expressão do aparato, deslocado de seu ambiente “natural”.

O que me recorda a discussão sobre as razões que levam o público, nas bienais, a fazer mais fila para o pavilhão de arte tecnológica do que para as salas classificadas como arte contemporânea, com menor, ou nenhum, convite à interatividade. Imagino que seja devido ao mesmo tipo de apelo que provocavam (e ainda provocam) os experimentos escolares nas feiras de ciências, onde, por exemplo, os cabelos ficam “em pé” por causa da eletricidade e viram motivo de brincadeira.

O escritor de ficção científica Arthur C. Clarke, que também era cientista, disse que a tecnologia avançada provoca nas pessoas o mesmo fascínio proporcionado pela magia. Com a arte tecnológica, pode-se emendar, esse fascínio encontrou novos portos, multiplicaram-se os objetos fascinantes para fitar.

E se tornou muito mais difícil ao olho contemporâneo destrinchar o que provém de um inquestionável talento (cuja conceituação parece ter perdido significado, com a desvalorização da aura romântica) e aquilo que pode ser só o resultado lúdico de uma boa sacada, potencializado pela curiosidade do público mais diante da novidade tecnológica do que da elaboração artística.
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Foto: AFP - Promoção de feira de energia na Alemanha, em janeiro.

3 comentários:

  1. Lembremos mais uma vez a afirmação de Benjamin: "a diferença entre a magia e a técnica é uma variável histórica".

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  2. Contudo a diferença entre mágicos e cientistas é mais visível, em dado momento histórico. Embora o que seja fruto de magia ou da técnica não seja tão reconhecível de cara, onde se aproximam as afirmações de Benjamin e de Arthur Clarke.
    Mas os artistas não são nem mágicos, nem cientistas, sendo capazes de ir além da magia e da técnica na apresentação (ou representação) de uma visão de mundo inscrita no âmago da obra.

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  3. A técnica se coloca no lugar da magia a partir de um certo momento da história, é isso que eu entendo da frase de Benjamin. Porém, ainda persiste um certo imaginário mágico atrelado à técnica. Vide as diversas narrativas em que um aparato técnico passa a servir de meio (media) sobrenatural.

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